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domingo, 14 de novembro de 2010

Legião Urbana faz canções para jovens em crise

Novo disco da banda, `A Tempestade', é manual de educação sentimental repleto de clichês
JOTABÊ MEDEIROS SP
Convenhamos: os versos do Legião Urbana não são o que costumamos chamar de "achados poéticos". Observem: Não confunda ética com éter/Não façamos do amor algo desonesto/Não se pode olhar pra trás sem aprender alguma coisa pro futuro/Tem gente que não tem nada e outros têm mais do que precisam. Todos esses MaCclichês estão em Tempestade (EMI), o novo disco do Legião, que é uma espécie de manual de educação sentimental para teenagers com crises existenciais e mesadas esporádicas. Renato Russo fala de como acha que o teen deve proceder em assuntos de amor, trabalho, amizade, lealdade, etc. Renato Russo, no entanto, não é uma "má influência", no sentido kierkegaardiano do termo. Nem é burro: fez o disco com uma intenção clara e incluiu até um manifesto dessa disposição, a canção Aloha, em que diz: A juventude está sozinha/Não há ninguém para ajudar a explicar/Por que o mundo/É esse desastre que aí está." Daí, Russo se dispõe a explicar o mundo. Ele tinha abandonado essa intenção desde que o acusaram de messianismo, nos já distantes anos 80. Sua determinação de dizer como o "órfão" adolescente deveria se comportar tinha esmaecido quando houve um quebra-costela monumental num show em Brasília, os "órfãos" se comendo de pau. Mas Russo voltou à carga em A Tempestade. O problema é que ele é um professor que subestima os alunos. Seu CD é, também em sonoridade, um disco que remete à Legião dos anos 80, os "anos teen" do rock nacional. Há equivalentes sonoros bastante evidentes, como a canção Dezesseis, que é um óbvio remake de Faroeste Caboclo, desta vez tendo como personagem um James Dean tupiniquim. O disco é muito ruim, para não ficarmos em eufemismos. Os tecladinhos batidos de sempre conferem aquele som pré-Smiths a canções-ladainhas (como o carro-chefe A Via Láctea), didáticas ou catequizantes. Quando é rock, é antediluviano, lembrando aquelas coisas a que fomos submetidos nos anos dourados: Zero, Capital Inicial, RPM. No mundo das hipóteses, sinceramente, é até preferível que tenha sobrado Renato Russo ditando regra do que o inferno que seria agüentar Paulo Ricardo ou Guilherme Isnard ou Dinho Ouro Preto, se esses tivessem sobrevivido. Renato Russo é um dos mais interessantes artistas do rock nacional e é também um dos mais obstinados. Quando faz discos-solo, como o excepcional Stonewall Celebration, se supera e mostra que tem referências. Com o Legião, alterna bons e maus momentos, como esse Tempestade, mas não se pode dizer nunca que seja incoerente.

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